Textos de gaveta.

Essa espécie de amor, em três actos

Act 1.

Julgo que o que fez abater a gravidade interna sobre os frágeis joelhos foi vê-lo. E ali descobrir algo de maior. Algures entre os seus olhos e a leveza sem culpa com que os desviava de mim, havia a matéria desejável de um arquétipo, de bem ou de belo seguramente, mas com a acessibilidade dos grãos de areia. O divino e o mundano negociavam-se quando ria, e o céu caía-me sempre em cima no mesmo instante. A voracidade passional eleva-se e faz-se delicada. Embrulha-se delicada, sem dar conta. Assim se tece no coração a consciência de que ele nasceu, pela primeira vez.


Act 2.

Não fechar os dedos em busca da contenção absoluta. Querer é muito isto: da pele e das fugas alheias. E reconhecer nelas a mesma liberdade que peço para mim ao mergulhar na minha surdez. Talvez por isso só nos encontremos verdadeiramente ao subir da maré, quando cedo eu quando cedes tu. Recolho vezes sem conta, quase te convencendo que para trás deixo apenas a humidade, e que todos os outros dias não doem imensamente como o frio. Fujo-te o mais que posso. Levo-te tanto quanto consigo.


Act 3.


Talvez um dia seja capaz de te deixar sem mais, com o mesmo desprendimento com que se larga um copo qualquer com alguma água já bebida, à beira de um balcão, igual a todos os outros. Para já, persistes enquanto elemento. E água é água. Fazer o quê?...

Comentários

Richie disse…
Dizer o quê? Tu sabes que eu sei o que... :o) e só posso acrescentar isto: é tão especial amar assim, tão mas tão transcendente, dilacerante e belo, o jogo perpétuo da água e da rocha... isto é amor que tem de dar certo!

Já sabes, Joaninha
torço muito :o)

Beijinho grande e até mais... :o)
Anónimo disse…
Pelos vistos, torcer muito não foi suficiente... não é? :)

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